Estreia de Ricardo Zalcberg Angulo na
literatura fomenta debate sobre o peso social dos diagnósticos relacionados à
saúde mental
Aos 19 anos, o universitário Ricardo Zalcberg Angulo
estreia em grande estilo no cenário literário nacional. Em O Fardo da Lucidez, um
ensaio ficcional sobre a loucura, o autor advoga a favor da luta antimanicomial
de forma poética e engajada. Manuscrito ao longo de quatro meses durante a
pandemia, o título nasceu de uma experiência do jovem com uma situação
limitante.
Impossibilitado
de frequentar a escola e imobilizado por conta de um acidente que sofreu
durante a quarentena, o estudante passou a se dedicar à escrita intuitiva e às
pesquisas sobre saúde mental, inspirado pela leitura de obras de grandes
autores como Clarice Lispector, Franz Kafka, George Orwell, Nise da Silveira,
Michel Foucault e José Saramago.
O
romance revela a trajetória da professora Malda, diagnosticada com
esquizofrenia e classificada como inapta à convivência social. Internada, seu
destino cruza com o do psiquiatra Dante Portofino. O profissional, embora
cercado por colegas egocêntricos e pouco empáticos, passa a olhar os pacientes
além dos transtornos e doenças, disposto a tratá-los sob os preceitos da
humanização, indo além dos protocolos estabelecidos.
Dante
se impressiona pelo fato da dita louca dar voz aos mais variados sentimentos de
forma coerente. Conforme a verdade de Malda vem à tona, o psiquiatra compreende
a estética de sua maneira pouco convencional de se comunicar, e percebe que uma
consciência criativa, mesmo que pareça louca, por ser livre do peso da lucidez,
pode trazer alívio e leveza à vida.
Meu
corpo não consegue compreender tamanha crueldade; meu coração, que reconheço
pulsar um sangue de hemácias anárquicas, tortas, metaforicamente
falciformes, batalhadoras e insubordinadas, palpita de forma feroz por
essa realidade tristíssima… Não me conformo com tudo que ocorre! Escrevo isso,
pois egoísmo é uma substância que contamina pouco minhas veias excessivamente
humanas… Minha mão insiste em escrever o que mais me incomoda em toda a
história de Malda,um sofrimento incoerente: não sofre porque é “louca”, mas
porque é dita ser. Não deciframos completamente o humano em seu mais puro
estado, em todas as suas linguagens, e ele, soberano de si, se pronuncia como
um fogo feroz… É uma chama tão simples, mas inextinguível enquanto estiver
viva.
(O Fardo da Lucidez, p.
156)
Para
o autor, embora sua geração tenha mais acesso a tratamentos psiquiátricos e
informações sobre o tema, não é levada a pensar acerca dos diagnósticos e da
sentença que estes podem representar ao ser humano. Ricardo considera que a
identificação com o diagnóstico psiquiátrico é parte constitutiva da identidade
do jovem atual.
Segundo
ele, quando o indivíduo se identifica com o transtorno a ele atribuído, cria-se
uma conformidade e não há superação de uma parte tida como indissociável. Para
uma geração em que os transtornos psiquiátricos constituem suas identidades,
debater o impacto das classificações se torna uma discussão de primeira
importância.
Ao
chamar a atenção para a crueldade de se manter pessoas apenas como material de
estudo e questionar todos os limites impostos aos “loucos”, o livro propõe um
debate sobre o fomento ao preconceito. O
Fardo da Lucidez
convida os leitores a se questionarem sobre o medo de conviver com pessoas
consideradas estranhas ou diferentes e a repensar os laudos que as colocam à
margem da sociedade. Embora denuncie a vaidade, a ganância e a avareza, a obra
de Ricardo também traz uma mensagem de esperança, solidariedade, compaixão e
tolerância.
Ficha
técnica
Livro: O Fardo da Lucidez
Autor: Ricardo
Zalcberg Angulo
Editora: Labrador
ISBN: 978-6556252469
Páginas: 288
Preço: R$
59,90
Onde encontrar: Amazon
Sobre
o autor
Ricardo Zalcberg Angulo é um jovem escritor da cidade de
São Paulo. Passou a escrever depois de um acidente que o deixou com fraturas
ósseas e movimentos restritos por meses. Ele debuta com o romance O Fardo da
Lucidez, escrito durante a pandemia.
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