Da matemática à programação: a trajetória de um professor e futuro programador

 


Antes de conhecer a 42 São Paulo, eu estava em um processo de repensar a minha carreira. Professor de Matemática e de Língua Brasileira de Sinais (Libras), comecei a refletir sobre uma real mudança para a área de programação – que, de alguma forma, tem uma sinergia com meus conhecimentos e formação inicial. Era uma possibilidade, mas nada de concreto. Esse projeto começou a ganhar uma dimensão tangível quando o meu namorado enviou uma reportagem da Época Negócios pelo WhatsApp sobre uma escola francesa que ensina programação sem professor e sem cobrar nada do aluno. A matéria me instigou a pesquisar mais sobre a organização e, quanto mais eu lia, mais me apaixonava pela proposta pedagógica, a excelência, a gratuidade. Óbvio que esse encantamento se transformou em ação, assim que as inscrições para o processo seletivo foram abertas.

Nesse momento, eu não sabia muito o que esperar. Embora estivesse inclinado a mudar de carreira, o repertório que eu tinha sobre a área de tecnologia era o da maioria das pessoas: uma profissão com predominância de homens brancos, heterossexuais, das classes A e B. Ao contrário do que sou: negro, gay e pobre. Ainda assim, decidi que enfrentaria o desafio. Passada a inscrição vieram os primeiros testes, a visita à 42, a piscina. De cara, a constatação de que o ambiente era mais diverso do que imaginava, o que contribuiu para minha dedicação ser completa, meu recorde foi 38 horas sem voltar para casa, vivenciando a 42 São Paulo em sua plenitude. Em média, passava umas 17 horas experimentando, explorando, aprendendo e ensinando. Olho para trás e me pergunto como consegui ficar tanto tempo mergulhado nesse processo. O fato é que estar lá sempre foi muito gratificante, muito instigante.

Em determinado momento, uns 10 dias após o início da piscina, o staff me perguntou como a experiência na 42 São Paulo poderia ser ainda melhor. Respondi de pronto que se tivesse uma ajuda para a alimentação poderia ter mais conforto. Ou seja, em vez de chegar em casa e cozinhar ou descongelar algum alimento, poderia descansar e me preparar para a jornada do dia seguinte. Eis que essa conversa evoluiu para uma bolsa, um apoio para que não me preocupasse mais com essa questão. Ao longo dos dias me vi evoluindo muito, trocando demais com os cadetes e fortalecendo os vínculos. Mesmo nos momentos mais difíceis, quando olhava para o colega da esquerda e chorava junto, olhava para o da direita e recebia o incentivo para ir adiante. O impacto dessa força da parceria é muito forte, a troca de experiências é o alicerce da metodologia. Como professor sempre tive os horários muito bem definidos e, na 42, tenho a oportunidade de trabalhar em horários alternativos, como a madrugada, por exemplo. Aquele receio inicial se transmutou em um reconhecimento de um espaço muito acolhedor, um ambiente onde cultivo relações boas e verdadeiras.

Diante da pandemia – e da necessidade de mudarmos para o ensino remoto – todos tivemos que nos adaptar. O começo foi muito difícil, sobretudo, porque eu estava adaptado a uma rotina diferente. Comentei, inclusive, com o staff e recebi como devolutiva um apoio imensurável. Afinal, todos estávamos imersos em um novo contexto e, não somente os cadetes, mas a própria 42 precisou se reinventar. Hoje, mais adaptado, posso dizer que voltei a evoluir no aprendizado e na colaboração. Com a construção de um ótimo alicerce durante esse quase um ano já posso dizer que consigo contribuir muito à área.

Quero construir com a 42 São Paulo um ambiente mais diverso. Já vejo mulheres, negros, pessoas com deficiência no ambiente da escola, mas quero ver mais! Devemos e vamos incluir mais gente. É um processo que está apenas começando.

| Laercio Candido. Fluminense de Nova Iguaçu, pai de pet e boardgamer, leciona Matemática e Física há 16 anos. Por meio de uma aluna conheceu, em 2010, a comunidade surda; cursou pós-graduação em Educação Especial com ênfase em surdez e, desde então, atua com esse público.

 

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