Por Isabel Marçal e Milena Fanucchi
Quem nunca se sentiu excluído, sozinho, ignorado ou
envergonhado por ter pensamentos recorrentes que são classificados pela
sociedade como inadequados? Essa sensação é resultado do hábito – construído e
reforçado pelo convívio em sociedade – de não expor sentimentos negativos.
Falar sobre as nossas dores, angústias e tristezas é praticamente um tabu. Esse
silêncio, aliás, nos levou à situação mundial que enfrentamos atualmente: um
adoecimento mental da sociedade, incluindo jovens e crianças. O século XXI é
marcado pelo boom
das doenças relacionadas à mente, principalmente, as decorrentes da ansiedade e
da depressão. No mundo, uma em cada três pessoas sofre com problemas
relacionados à ansiedade; 322 milhões vivem com depressão. No Brasil, a
situação é bem grave, pois somos o país com mais ansiosos do mundo e o quinto
em casos diagnosticados de depressão.
Os
jovens, em especial os adolescentes, são os que mais sofrem com problemas de
saúde da mente, ou seja, um a cada cinco vivem um sofrimento psíquico. Dos 10
aos 19 anos, vivemos uma situação única, totalmente peculiar e de transição, na
qual múltiplas mudanças físicas e emocionais acontecem, fazendo com que a
criança se transforme em um adulto. Mudanças geram medo, insegurança e dúvidas
– e não fomos ensinados a lidar com esses sentimentos quando crianças. Segundo
a Organização Mundial da Saúde (OMS), metade das doenças mentais começa na
faixa etária próxima aos 14 anos; o suicídio, infelizmente, é a terceira
principal causa de morte entre adolescentes mais velhos (de 15 a 19 anos). No
Brasil, houve um crescente considerável e assustador no número de suicídios
nesse período de vida.
Mas,
por que tantos adolescentes tiram a própria vida? Segundo a OMS, as tentativas
de suicídio podem ser impulsivas ou ligadas a um sentimento de desesperança ou
solidão; esse é o último passo, a última tentativa para acabar com o
sofrimento. Algumas situações podem colaborar com essa atitude – uso de drogas,
o abuso infantil e, principalmente, o estigma que gira em torno dos transtornos
mentais. A maneira mais eficaz para acabar com esse preconceito com a saúde
mental é falar sobre o assunto e, acima de tudo, escutar com atenção e empatia
o que o outro está falando ou demonstrando. Todos os casos de suicídio
apresentam algum sinal. É necessário olhar para o outro com atenção e estar
disposto a ouvir e ajudar; e, sem dúvida alguma, o passo mais importante é se
permitir olhar para dentro, identificar e acolher seus sentimentos, sabendo que
todos nós estamos buscando a felicidade, mas que também sofremos com a tristeza
e isso é normal. Na verdade, é bem mais do que normal, é o que nos humaniza.
Empatia
– palavra gasta e “batida” pelas redes sociais, mas pouco aplicada –, significa
a habilidade de imaginar-se no lugar de outra pessoa, observar e buscar sentir
ao máximo o que ela está passando. Só com ela que conseguimos ajudar, de fato,
o próximo, assim como a nós mesmos. Isso porque ter esse sentimento por nós,
também, é extremamente necessário. Um dos meios de cultivar empatia é por meio
de histórias, que podem nos inspirar e despertar auto-observação. Para nós,
compartilhar experiências fortalece tanto quem expõe (seja pela escrita ou pela
fala) quanto quem recebe (seja pela leitura ou pela escuta ativa), além de ser
capaz de gerar transformações pessoais e coletivas.
Quando recebemos o convite da Editora Burn Books para fazer parte da
antologia Você não está sozinho – uma coleção de
contos que rompe o silêncio –, não havia como recusar. Até porque, há dois
anos, resolvemos dedicar nossas carreiras à promoção e à prevenção da saúde da
mente ao nos reunir com pessoas que compartilhavam a vontade de atuar com a
saúde da mente. O Instituto Bem do
Estar nasceu desse desejo que se tornou missão.
Você
não está sozinho, cuja
parte da renda de venda será doado ao Instituto Bem do Estar, vai muito além de
dar voz aos sofrimentos psíquicos, gerar identificação e acolhimento. Esse
livro nos traz conhecimentos sobre saúde mental, aproximando os jovens dos profissionais
de atendimento terapêutico, assim como diminuindo o abismo entre eles e o
preconceito que ronda a saúde mental. Todas as histórias são seguidas de uma
carta escrita por um psicólogo – que conversa sobre os assuntos abordados
naquele conto, esclarecendo muitos pontos e direcionando de maneira simples e
direta como buscar apoio. Esta era uma grande preocupação dos organizadores,
Guilherme Cepeda e Lari Azevedo, autores da obra, não queriam que fosse somente
uma coleção de contos; desejavam fazer do livro uma fonte de conhecimento e
mostrar a importância de procurar ajuda profissional. Foi a partir da premissa
da conscientização que observamos outros pontos importantes que essa obra nos
traz.
Desmistificar
o tratamento para saúde mental é o primeiro passo para conseguirmos diminuir os
dados crescentes de suicídio e de transtornos. Nossa mente merece e precisa
urgentemente ser tratada como qualquer outra parte do nosso corpo. Por que,
quando sentimos dor de dente, vamos ao dentista? Por que, quando sentimos dor
no peito, vamos ao cardiologista, mas, quando a dor é na alma, ignoramos e,
pior, achamos que é fraqueza? Isso precisa acabar. A terapia com psicólogo e/ou
psiquiatra é para nos conhecermos, entrarmos em contato com nossas
necessidades, anseios, dificuldades e sentimentos. Muitas vezes, como fazemos
para sanar outras dores, é necessária uma medicação. Como diz o psiquiatra
Ricardo Feldman – colunista do Instituto Bem do Estar – “os transtornos mentais
podem incapacitar e prejudicar tanto quanto as doenças ‘físicas’ e, assim como
elas, também possuem tratamentos eficazes para restabelecer a saúde, o
equilíbrio e o bem-estar.”
Além
do apoio profissional, contar com uma rede de apoio formada por pessoas de
confiança é extremamente importante. Ter com quem conversar e desabafar e a
quem pedir ajuda pode evitar resultados piores. Por isso, lembra-se da empatia
que a gente comentou? Pois bem, ela pode e deve aparecer por aqui também.
Quando olhamos para o outro, conseguimos identificar os pequenos sinais que a
pessoa em sofrimento pode estar tentando mostrar.
Talvez
você esteja se perguntando se é possível prevenir os transtornos da mente. Sim,
é possível. Não tenha medo de olhar para dentro, observe suas emoções e tente
identificar quais pensamentos e ações levam a elas. Busque reservar um tempo só
para você e exercite a sua presença. Por quê? Normalmente, a ansiedade está
ligada à preocupação excessiva com o futuro e à depressão do passado, então,
nada melhor do que ESTAR PRESENTE para cuidar da sua mente. Existem diversas
técnicas que colaboram para a auto-observação, como a meditação e a atenção
plena. O autoconhecimento é a chave para a prevenção. Por isso, esteja
presente, cuide da sua mente, cuide Bem do seu Estar!
Isabel
Marçal é
especialista em gestão de projetos sociais, com 15 anos de experiência no setor
de Impacto Social e, no momento, especializando-se em Psicanálise. Apaixonada
pela vida, seres humanos e suas relações, sonha com uma sociedade mais saudável
e justa, por isso, acredita que o primeiro passo esteja na consciência
individual de cada ser humano. Atualmente é presidente e cofundadora do
Instituto Bem do Estar.
Milena
Fanucchi é comunicadora
em multimeios e em publicidade, com experiência no mercado do Turismo e no
setor de Impacto Social. Em constante transformação, sou observadora, ouvinte
ativa e sonhadora, acredito que autoconhecimento + empatia podem transformar
nossos relacionamentos (conosco e com os outros). Atualmente é vice-presidente
e cofundadora do Instituto Bem do Estar.
Sobre
o Instituto Bem do Estar | Fundado
em 2018 por Isabel Marçal e Milena Fanucchi, o Instituto Bem do Estar é um
negócio social sem fins lucrativos voltado à promoção da saúde da mente. Com o
propósito de desafiar as pessoas a mudar o próprio comportamento em relação à
saúde da mente, a organização colabora com a prevenção de doenças psicológicas
e contribui para uma sociedade mais consciente e saudável. Para tal, possui
três frentes de atuação, que visam a transformação social necessária a uma
sociedade que está em falência emocional. No pilar CONSCIENTIZAR, informa a
população sobre os cuidados para uma saúde da mente de qualidade, estimulando a
busca pelo autoconhecimento e o despertar da empatia por meio de conteúdo
digital, campanhas de conscientização e mostras e exposições culturais. Em CONECTAR, promove
experiências do cuidado com a mente, proporcionando ferramentas que contribuem
com o desenvolvimento socioemocional individual e coletivo por meio de
atividades práticas, como vivências, workshops e palestras, além da divulgação
de locais de atendimento terapêutico gratuitos ou por contribuição consciente.
Em MOBILIZAR,
entende o contexto sobre saúde da mente e o impacto na sociedade, gerando
estatísticas e articular agentes públicos e privados, visando o acesso a
políticas públicas via pesquisas e práticas de advocacy. www.bemdoestar.org
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