Em entrevista, autora Virgínia P. Pagliarin
comenta motivações para criar protagonista assexual em "Um mundo de
cores"
Apesar de livros com protagonismo
LGBTQIAP+ terem ganhado popularidade nos últimos anos, a escritora Virgínia P.
Pagliarin percebeu que algumas
letras da sigla ainda eram pouco exploradas na literatura brasileira.
Analisando este cenário, ao buscar um tema para seu novo livro, a autora
decidiu escrever sobre assexualidade, orientação para definir as pessoas que
não sentem atração sexual, ou podem ficar atraídas em determinadas
circunstâncias.
Foi assim que surgiu Um mundo de cores. A obra tem como personagem principal Camila, uma jovem que
passa pelo processo de autodescoberta e que, por muito tempo, não sabia que
existia uma palavra para explicar seus sentimentos. Nesse processo de
autoconhecimento, ela estabelece uma rede de apoio com pessoas que a
compreendem e a aceitam, sem julgamentos ou piadas.
Com referências positivas para o público que busca
representatividade em conteúdos culturais, o livro explicita outras
possibilidades para o amor romântico e dissemina conhecimentos sobre o assunto.
Confira abaixo a entrevista exclusiva com a autora.
- Dentre todas as letras da sigla
LGBTQIAP+, você optou pela “A”, que trata da assexualidade. Qual a importância
de falar sobre o assunto, principalmente, na sociedade atual?
V.
P. P: A Camila nasceu na minha mente e se recusou a ir embora. Escolhi dar voz
a ela para que ela contasse sua história e passasse uma mensagem que se perde
em uma sociedade hipersexualizada
como a
nossa: o amor não se resume à parte física. É algo muito maior. Camila veio
para ensinar às pessoas sobre a assexualidade e como é possível ter
relacionamentos amorosos mesmo sendo assexual. Eu espero que meu livro ajude
pessoas que se sentem excluídas, porque
eu quis
mostrar que existem muitos tipos de amor e ensinar um pouco sobre a causa
LGBTQIA+. Para a minha pesquisa, percebi que existem mais obras voltadas para
públicos "L" e "G", e é muito importante não apenas mostrar
para os jovens outras formas de amor, como também normalizá-las. Quis
demonstrar ao leitor que amar de uma forma diferente do convencional não é
errado – e não somente na sexualidade, mas em outros tópicos, como idade e
distância. Acredito que a história
da Camila ajudará muitas pessoas a entenderem mais sobre o tema e espalhar empatia. Quem sabe, pode até ajudar
pessoas que se sentem diferentes e também não entendem essa sensação de
"não se encaixar".
- Por que devemos falar sobre outras
formas de amor romântico?
V.
P. P: O amor não tem forma, não é uma ciência exata e não é só baseado em
demonstrações físicas de afeto. Ter uma percepção de sentimentos diferente do
que a sociedade espera não é estranho e nem motivo para piada. É preciso
coragem para abraçar a mudança, para ser diferente e para fugir dos padrões
impostos pela sociedade. Espero que a história
da Camila ajude a conscientizar mais pessoas sobre a assexualidade, na
esperança de ajudar na normalização do assunto no futuro.
- Camila passa por um processo de
autoconhecimento pessoal e há pessoas de seu círculo social que não a
compreendem. Apesar disso, não é um período repleto de sofrimento, porque ela
tem uma forte rede de apoio. De que forma essas referências positivas podem
contribuir na construção da autoestima dos leitores que têm histórias
semelhantes à de Camila?
V.P.P: Quando percebemos que temos dúvidas existenciais
profundas e externamos para os outros, normalmente a resposta que ouvimos é
“você tem tempo pra pensar nisso?”. Então, quando algo nos incomoda, a
tendência é que aquilo fique guardado dentro de nós mesmos. Apesar de nunca ter
se falado tanto na mídia sobre saúde mental, cuidados com você mesmo e práticas
do bem-estar psicológico, a verdade é que muitas pessoas ainda não entendem o impacto
que a falta de empatia tem na sociedade como um todo. Esse sentimento se aplica
a alguém lutando contra uma depressão, contra uma síndrome de burnout (esgotamento psicológico) e também para as pessoas que
estão se autodescobrindo sexualmente. Levamos tudo isso em conta e acabamos
tendo dificuldade em confiar nossos problemas para as pessoas de quem gostamos
por medo de sermos ridicularizados – amigos, família, parceiros amorosos. Mas
nem sempre o pior cenário se confirma: Camila estava, sim, insegura com tudo o
que descobriu e com o que passou. Mas no momento em que confia sua angústia aos
amigos, mesmo que eles não tenham resolvido seu problema, uma carga emocional
enorme saiu de seus ombros, e ela pôde refletir com mais clareza sobre suas
opções para o futuro.
- O outro lado da Camila é que ela está
se estabelecendo na carreira e sonha em ser escritora. Qual foi sua intenção ao
tratar a personagem não apenas na perspectiva da sexualidade, mas também
profissional?
V.P.P: Escolhi a profissão da Camila por conta da minha
experiência de publicar meu primeiro livro, “Lissandra de Hallaren”, da saga
“The Real Mirror”. Quem não trabalha nessa área e vê o livro na prateleira da
livraria, não sabe como o processo para seu lançamento foi complicado e nem imagina
as dificuldades que eu e outros autores enfrentamos todos os dias no mercado
literário brasileiro. Não basta escrever: é preciso muita determinação e
paciência para realizar esse sonho e transformar o rascunho do documento de
Word em um livro.
- "Um mundo de cores” é seu segundo
livro publicado. Você já tem planos para outros projetos literários? Se sim,
quais?
V.P.P: Com certeza! Sou uma das participantes da antologia
“Mensagem para Você”, da Lura Editorial, que será lançada ainda neste ano. Além
disso, meu próximo livro independente tem lançamento previsto para janeiro de
2023 pela UICLAP. “Henrique de Norak” será o segundo volume da série “The Real
Mirror” e acompanha as aventuras de Henrique e Lissandra, que precisam
desvendar o misterioso desaparecimento das crianças das vilas de seu reino. O
primeiro volume “Lissandra de Hallaren” já está disponível para compra no site
da UICLAP e na minha loja oficial da Shopee.
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